Malema, Nampula — A madrugada de 8 de setembro mergulhou o distrito de Malema numa tragédia que expõe não apenas a dor de uma família, mas também uma ferida aberta da sociedade moçambicana: a violência doméstica. Nelson João de Deus, delegado do Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ), foi encontrado morto dentro da sua residência com sinais visíveis de agressão física. Horas mais tarde, a sua esposa foi localizada numa casa abandonada, já sem vida, após alegadamente ingerir uma substância tóxica.
Testemunhas afirmam ter ouvido discussões intensas entre o casal durante a madrugada. Pouco depois, a mulher entregou as chaves da residência a uma vizinha, sem dar explicações, antes de desaparecer. A polícia investiga se estamos perante um homicídio seguido de suicídio ou se existem outros elementos ainda encobertos que possam alterar o rumo do caso.
De acordo com Jornal O Destaque, Rosa Nilza Chaúque, porta-voz da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Nampula, confirmou a abertura de um inquérito formal. “As investigações estão em curso e mais detalhes serão tornados públicos no devido tempo”, declarou.
Contudo, o impacto do caso transcende as paredes daquela casa em Malema. Em menos de 72 horas, dois homens foram mortos pelas próprias esposas na província de Nampula, segundo fontes locais. Um padrão começa a emergir, levantando a delicada questão: a violência doméstica em Moçambique está a ganhar novas expressões, menos debatidas e mais difíceis de enfrentar?
O sociólogo Guidion Pandze explica que este fenómeno desafia as narrativas tradicionais. “A ideologia de género vigente tende a ‘masculinizar’ a violência, colocando o homem sempre como agressor. Mas os dados começam a mostrar que a violência é uma via de duas mãos. Quando ignoramos essa realidade, deixamos de proteger tanto mulheres quanto homens.”
A morte do delegado do IPAJ e da sua esposa acende um alerta vermelho sobre a urgência de políticas públicas integradas contra a violência doméstica, que considerem não apenas o contexto patriarcal, mas também as transformações sociais e psicológicas que alimentam tragédias conjugais.
O caso continua sob investigação, mas a pergunta que paira é inescapável: quantos alertas ainda serão necessários para que Moçambique enfrente de frente o problema da violência dentro dos lares?