Maputo – Um testemunho estarrecedor vindo da Universidade Eduardo Mondlane (UEM) expôs de forma brutal a sombra do assédio sexual no meio académico. Uma estudante relatou ter sido obrigada a repetir a mesma disciplina quatro vezes ao longo do curso, depois de recusar convites de caráter sexual feitos por um docente.
O caso, revelado numa reunião recente sobre assédio académico, lança luz sobre a fragilidade dos mecanismos de proteção aos estudantes e a aparente impunidade de professores com estatuto de “intocáveis”.
O TESTEMUNHO DA VÍTIMA
Entre 2013 e 2016, a jovem enfrentou humilhações públicas, reprovações sucessivas e intimidações. Segundo o seu relato, o docente em questão usou a sua posição de poder para retaliar após a recusa a “encontros pessoais”.
Colegas confirmaram que situações semelhantes já haviam sido observadas, mas o medo de represálias travou outras denúncias.
O episódio mais chocante ocorreu no quarto exame de recurso:
O professor fez apenas uma pergunta oral.
Finalizou com a frase: “Agora já sabes quem manda na minha disciplina.”
Em seguida, atribuiu a aprovação com a nota mínima de 10 valores.
“Foi um martírio psicológico que deixou marcas profundas na minha vida académica e pessoal”, desabafou a estudante.
A REAÇÃO DA UNIVERSIDADE
Apesar de ter recorrido à direção da faculdade e solicitado alternativas – como frequentar a disciplina noutra unidade da UEM –, os pedidos foram rejeitados.
Somente mais tarde, já com o caso encerrado, tomou conhecimento da existência do Centro de Coordenação de Assuntos de Género (CECAGe), que poderia ter dado apoio institucional.
O docente acusado continua a lecionar na Faculdade de Letras e Ciências Sociais, o que levanta sérias questões:
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Quantas vítimas mais poderá ter feito?
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Por que razão a instituição não agiu de forma imediata?
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Até que ponto o silêncio da UEM alimenta a cultura de conivência?
O PADRÃO DO SILÊNCIO
Especialistas em género e educação afirmam que este caso é apenas a ponta do icebergue. Em muitas universidades africanas, o assédio sexual é tratado como tabu, sendo abafado por medo, vergonha ou relações de poder.
“A omissão das instituições abre espaço para que abusadores reincidam, perpetuando um ciclo de trauma e silêncio”, comenta uma ativista ligada a organizações estudantis.
UM CHAMADO À RESPONSABILIZAÇÃO
O episódio reacende o debate sobre:
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A criação de mecanismos eficazes de denúncia;
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A proteção de estudantes contra represálias;
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A necessidade de comissões independentes de investigação.
Enquanto o caso não é esclarecido publicamente, permanece a sensação de que a maior universidade do país carrega um grave problema de assédio institucionalizado que ameaça não apenas a dignidade, mas também o futuro académico de centenas de estudantes.